Dentro do modelo paperless, o desafio é avançar a digitalização para fora dos hospitais, principalmente na relação com as operadoras
Por Roberto Gordilho
Avançar a maturidade digital das organizações de Saúde é um processo que precisa extrapolar as paredes do hospital. Aliás, o cuidado continuado, a experiência otimizada em todos os pontos de contato entre cliente e instituição e uma real mudança de paradigma (no qual o cliente está, de fato, no centro do negócio) implicam não somente na transformação da cultura interna. Para que as ferramentas e sistemas entreguem o valor almejado, todos os elementos externos devem operar no mundo digital – principalmente o relacionamento com as operadoras, ainda um dos grandes gargalos na Saúde.
Os agentes externos de uma organização precisam perceber a importância da operação integrada e digitalizada pela ótica dos clientes. Já é passado o tempo em que as pessoas concordavam com a espera por uma ação que não dependia do hospital. Os clientes querem uma experiência contínua e a garantia de que o cuidado será mantido de igual maneira, independentemente de quem é a responsabilidade por ele. Além do comprometimento com a entrega desses valores, existe também o risco da concorrência: negócios inovadores estão chegando ao mercado cada vez mais rápido, com produtos e serviços otimizados por uma cadeia totalmente integrada e funcional, a exemplo do que já acontece com os SuperApps.
Antes de nos aprofundar a respeito das questões sobre a integração digital do relacionamento com parceiros, fornecedores, laboratórios e operadoras de planos de Saúde, é preciso entender como a cultura paperless (ou sem papel) tem beneficiado diversos negócios dentro e fora do setor.
O Paperless Office
O escritório do futuro, ou Paperless Office, foi um ideal fomentado na década de 1960. Foi o período em que os computadores pessoais começaram a se tornar mais acessíveis e fáceis de transportar. Além disso, a cultura social já apresentava preocupações com a sustentabilidade dos negócios e o prejuízo que os papéis geram para o meio ambiente. Indústrias diversas mantinham um departamento e espaço físicos próprios para os arquivos mortos, somente para exemplificar a realidade daquele período até o milênio atual.
E o escritório paperless foi idealizado por quem mais atuava no compartilhamento de documentos impressos durante a década de 1970. Em meados desse período, em 1975 sendo mais exato, a revista Business Week publicou um artigo intitulado “O Escritório do Futuro”, assinado pelo diretor do Research Center Incorporated (PARC) da Xerox Corporation, George E. Pake, no qual ele previa que em 1995 qualquer documento produzido por uma empresa poderia ser acessado na tela de um computador com um apertar de botão.
Enfim, o fim do papel nos escritórios já era uma realidade idealizada pela maior companhia de fotocópias (também inventora da máquina de fotocópia). Atualmente, a Xerox Corporation é um dos players líderes do setor de tecnologia da informação e documentação.
Na Saúde
Quase 50 anos passaram desde as previsões feitas pelo diretor de pesquisas da Xerox. E muitos gestores na Saúde atual ainda não sabem o quão básico é digitalizar processos, documentos e integrá-los por meio de tecnologias de arquivamento (nuvem) e compartilhamento seguro. Ou seja, digitalizar a operação e transformar a cultura organizacional para o trabalho no mundo digital deveria ser tarefa primária. Mas, muito além disso todo o trabalho tem de ser levado para os atores externos da organização de Saúde.
Uma das formas de executar essa transformação é expandir a assinatura eletrônica. Pouco eficaz é o compartilhamento de documentos se a validação ainda exige uma ação física dos responsáveis. A área assistencial percebeu a importância dessa mudança com o fortalecimento da teleconsulta. Afinal, o cuidado do paciente precisa de continuidade, seja para a compra de medicamentos prescritos ou o encaminhamento para exames laboratoriais – tudo é feito digitalmente.
No back office não é diferente. O desafio ali, contudo, é levar essa prática para os agentes terceirizados: fornecedores e operadoras, principalmente. Nesse caso, entram em jogo as habilidades de negociação dos gestores. O fim do papel precisa ser uma realidade para cada autorização ou validação com os convênios e também para a área do faturamento. Trata-se de uma transformação cultural e operacional.
O desafio é grande, porém, urgente. A expansão da cultura paperless implica diretamente na experiência dos clientes. É o tempo de espera por um laudo ou autorização que transita em um fluxo físico e pode prejudicar a segurança e o tratamento dos pacientes. Mais que isso, para as organizações de Saúde trata-se também de uma questão de garantir a confiança a seus clientes. Ou seja, muito é investido (recursos, tempo, energia) explicando a demora e falta de eficiência em um processo executado no papel e que muitas vezes está fora das mãos do hospital.
Portanto, não basta ter uma forte cultura digital interna. É preciso compartilhá-la e, assim, manter a qualidade operacional e segurança dos pacientes – sem falar em garantir o próprio faturamento.
Trabalho de casa bem feito, o passo seguinte é ajudar na organização das casas vizinhas e parceiras.